quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Bolero de Ravel - Sergiu Celibidache

Fiquei extasiada quando vi o Celibidache pela primeira vez. Sigo em êxtase a cada vez que o revejo, e reencontro o mesmo fascínio nos olhos dos amigos pra quem já tive o prazer de mostrar essa imensa pérola. 

Muitos me perguntam por que eu ainda não tinha postado esse vídeo. Não tenho resposta para isso. Simplesmente não sentia que fosse a hora. Ainda não me era possível escrever a apresentação digna. Quem acompanha o blog sabe que não se trata apenas de adicionar mais um vídeo. Não, eu me compartilho um pouco através de cada pérola. Acho que estávamos amadurecendo, eu e a pérola.  

Eu tinha pensado em escrever uma breve apresentação biográfica desse incrível maestro. Mas não é isso que importa. O Celibidache não está no blog pelos cargos importantes que ocupou nas mais prestigiadas orquestras da Europa, nem pela profundidade azul-escuro de seus conhecimentos musicais. Na verdade, o deslumbramento está no oposto disso. Ele está aqui pela entrega comprometida a cada nota, pela permeabilidade ao invisível, por algo que está ao alcance de todos, mas que não se ensina e não se aprende: se é.  

Uma vez assisti a uma entrevista em que lhe perguntaram: "como você faz isso?". Com seu inglês macarrônico do leste europeu, o maestro respondeu: "you don't do anything. You let it envolves you".


Sergiu Celibidache conduz a Sinfônica Nacional Dinamarquesa, 1971
  

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terça-feira, 23 de outubro de 2012

A bunda do Dali


Contou-me uma professora de História que brasileiro gosta tanto assim de bunda por causa da escravidão. É que os homens de cor clara queriam muito distrair-se com alguma negrinha, mas viravam-nas de costas pra deixar o coito mais impessoal. Faz sentido, já que as teorias evolucionistas percorrem o caminho inverso pra explicar o surgimento do amor: na medida em que a nossa postura foi ficando mais ereta, inventamos a posição sexual que permite o olho no olho e que é privilégio exclusivo da espécie humana. E quando nos olhamos nos olhos... Razoável então supor que os portugas, muito bem casado com suas bigodudas de mesma cor, expressassem seu interesse meramente carnal reposicionando suas negrinhas na posição primitiva. E foi assim que a bunda garantiu seu lugar na vista panorâmica do brasileiro e entrou para o panteão dos desejos nacionais.

Infelizmente a hipótese da minha professora não é verificável. Mas não importa. Ela pode não estar certa quanto ao porquê, mas ninguém discute o poder de uma bunda, que eu mesma pude verificar essa semana.

Em 1925 Dali pintou Moça à Janela, possivelmente a minha tela favorita dele. Acho de uma poesia ímpar que ele nos mostre não a moça, mas o que a moça contempla. A imagem é um convite para a abertura, para ampliar olhares e perder-se no horizonte. Já há alguns anos penso em colocar um pôster da Moça no meu consultório de Psicologia. São muito parecidos os convites, o lançar-se do Dali e a descoberta do novo que eu proponho aos meus pacientes.

Dali e Psicologia


O Dali ainda não foi parar nas minhas paredes, mas foi a imagem que escolhi para a página inicial do meu site, que venho construindo nas últimas semanas. Terminei o esqueleto e encaminhei o link a alguns queridos, pedindo opiniões honestas sobre suas impressões.

Foi chocante. Eu havia me esquecido do que me contara a professora de História do colegial, e fiquei perplexa com o comentário geral sobre o Dali. “É muito bonito”, disseram, “poético e sugestivo... mas que bundinha, hein?”! Na primeira vez eu relutei. A segunda me chegou com explicações psicanalíticas de alto calibre, e eu comecei a suspeitar que o convite do Dali fosse outro. Contei o ocorrido ao meu irmão e ele deu-me o golpe de misericórdia: “eu não queria dizer nada, mas foi a primeira coisa em que pensei”.

Absolutamente resignada, recomecei minhas buscas pela imagem ideal. Dá-lhe Google, cheguei em O Livro Árvore, outro Dali. Tem também janela, amplidão de horizonte, azul que descansa a vista, mas a imagem ideal, a minha imagem ideal, eu já encontrara e era a tanajura do Dali. 


Depois da angústia veio a decisão. Munida de minha versão mais castradora triunfei sadicamente sobre os portugueses, sobre os psicanalistas e sobre o meu irmão; em nome das negrinhas, das fêmeas dos animais e da Moça eu me vinguei: cortei a bunda do Dali! E pronto, está inaugurado o meu site! 



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